Nesta postagem se pretende tratar de forma sumária uma questão indispensável para compreender melhor a Literatura de Fernando Pessoa e em definitiva grande parte das manifestações literárias modernistas portuguesas e internacionais, a heteronímia -ou constelação heteronímica neste caso-. Para conseguir esse objetivo é necessário reparar na figura de Álvaro de Campos em relação ao ortónimo, pois mesmo não sendo o heterónimo que precede a todos e de forma genuína inicia essa tendência de divisão da voz literária pessoana, pode-se afirmar que supõe um ponto de inflexão no nomeado recurso heteronímico porque é de fato uma parte fundamental -a voz mais relevante e complexa- do conjunto, do discurso de Fernando António Nogueira Pessoa. Além disso, aproveito para tratar brevemente também, muito em relação com o tema geral da postagem, a questão da Teoria do Cânone e a desconstrução da Teoria da Morte do Autor. Desde já, tenho que reconhecer que lendo um texto qualquer de Fernando Pessoa sem saber da sua autoria -questão obviamente complicada- dá para perceber que estamos perante uma obra genuína, extraordinária e indiscutivelmente portuguesa. A questão é certamente controvertida e não deixa de suscitar teses e analises que em vez de resolver perguntas, nos suscitam novas dúvidas.
Fernando Pessoa
Fernando António Nogueira Pessoa nasce o 13 de junho de 1888 em Lisboa (Reino de Portugal), concretamente no bairro do Chiado, no número 4 do Largo de São Carlos (frente à ópera de Lisboa) às três horas e vinte e quatro minutos da tarde. Os pais, Joaquim de Seabra Pessoa e Dona Maria Magdalena Pinheiro Nogueira, se podiam considerar como uma família da pequena aristocracia. O pai era um lisboeta funcionário e colaborador eventual do Diário de Notícias e a mãe era açoriana e trabalhava em casa. Eles moravam junto com o irmão que depois iria nascer, o Jorge (segundo filho), uma avó doente mental e duas criadas. O fato de ele chamar-se Fernando António é porque nasceu no dia de Santo António, que tinha como nome de batismo Fernando de Bulhões. Foi batizado no dia 21 de julho na Basílica dos Mártires do Chiado (Igreja católica) tendo como padrinhos ao general Chaby e a sua tia, dona Ana Luísa. A infância de Fernando Pessoa não foi muito fácil para ele, com cinco anos o pai morre no dia 24 de julho de 1893 vítima de uma grave tuberculose, um ano depois virá a morrer o irmão dele, o Jorge, sem completar nem o ano de idade. Com a ausência do pai, a fonte de ingressos da família se vê interrompida obrigando à mãe a prescindir de uma das criadas, vender parte da mobília familiar, e até finalmente a mudar-se com a família para uma morada mais humilde ao terceiro andar do número 104 da Rua de São Marçal. A sorte iria a mudar rápido pois um tempo depois, em 1894, Dona Maria conhece ao comandante João Miguel Rosa que era o cônsul geral de Portugal em Durban (África do Sul) e ficam apaixonados. Só um ano depois eles casam-se na igreja lisboeta de São Mamede. Sendo já a mulher do cônsul ela estava obrigada a acompanha-lo junto com o filho à cidade onde trabalhava o marido, então sem questioná-lo ambos dois viajaram primeiro até a Madeira no navio português «Funchal» e depois até o Cabo da Boa Esperança no navio inglês «Hawarden Castle». Fernando Pessoa cursará os estudos primários na escola irlandesa cristã West Street e fará lá a comunhão. Em 1899 ingressa no Liceu de Durban, onde freqüentará as aulas durante três anos sendo sempre um dos primeiros da turma. A formação cultural anglófona vai influencia-lo e aos seus seus escritos. Em 1901 morre a sua irmã Madalena Henriqueta, com só dois anos de idade. Cansados da vida em África a família decide voltar temporalmente para Portugal e passar vários períodos em diferentes lugares do Portugal peninsular e também nas ilhas dos Açores. Uma vez já afincado em Lisboa começa a desempenhar diferentes trabalhos como o de comercial, administrativo e aproveitando as suas competências linguísticas, neste caso bilíngues, como tradutor de textos técnicos e literários. A família volta a Durban sem Pessoa mas após um tempo ele decide voltar com eles. Para evitar o tédio e trabalhos pouco produtivos Fernando Pessoa se matricula no Durban Commercial School, para preparar-se para poder acessar à universidade, focalizando nos estudos humanísticos que sempre lhe tinham atraído. A primeira tentativa de entrar na faculdade não deu certo e ele teve que afiançar conhecimentos no Durban High School para se preparar novamente, foi então que ele conseguiu e acabou os estudos com sucesso. Após a graduação, Pessoa volta sozinho para Lisboa deixando definitivamente a sua família na África do Sul, era o ano 1905. Vai morar com a avó Dionísia para evitar gastar em alugueres e também para fazer companhia à idosa mulher. Em Lisboa freqüentará o curso de Letras da Universidade de Lisboa, onde aprofunda os seus conhecimentos e conhece a importantes personalidades da cultura e sobretudo das letras, embora um ano depois irá abandonar a faculdade por simples desinteresse no processo educativo. Pouco tempo mais tarde a avó irá morrer deixando-lhe uma pequena herança que ele usa para abrir uma tipografia que em pouco tempo foi a falência. Pessoa começa a desempenhar a labor de tradutor, trabalho que conservará a vida toda, tendo uma condição económica média e relacionando-se eventualmente na vida social lisboeta, freqüentando o café do Chiado «A Brasileira» com diversas personalidades como Mario de Sá Carneiro. Desde bem miúdo Pessoa começa a escrever vários tipos de textos, em várias línguas e atribuindo-lhe a autoria desses escritos a várias pessoas imaginárias, os heterónimos. As publicações em vida não foram muitas, mas cabe destacar os seus artigos em diversas publicações e as revistas Athena, A Águia e Orpheu (da qual será até o diretor e simbolizará a máxima representação do chamado Primeiro Modernismo português, mesmo a revista só conseguir publicar dois números «e meio» por problemas econômicos). Fernando Pessoa morre aos 47 anos de idade no dia 29 de Novembro de 1935 no hospital de São Luís dos Franceses de Lisboa provavelmente por problemas hepáticos ou pancreatite aguda, não se sabe exatamente, deixando um escrito em inglês na mesinha de cama dizendo algo assim como que «não sei o que o amanhã trará [sic]» e um imenso e extraordinário legado literário quase totalmente inédito que postumamente iria ser publicado, valorizado e teorizado pela periodização da Literatura portuguesa e internacional. A repercussão mundial de Pessoa não é certamente uma coisa irrelevante, temos que ser conscientes desta realidade pelo fato de ser o único autor literário português que passou a formar parte da Teoria do Cânone de Harold Bloom. Este fato é manifesto. Bloom considera que Luís Vaz de Camões, mesmo sendo o outro grande literato português, o outro peso pesado da literatura lusa, não teve a projeção que teve Pessoa. Camões contribuiu a consolidar o português como língua operante e prestigiada além de criar e consolidar a consciência nacional do país mas considera que isso escapa ao plano estritamente literário, e que o sucesso dele não foi tão louvável como o de Pessoa que passou a ser referência no modernismo mundial. Fernando Pessoa foi um autor muito produtivo, utiliza combinadamente temáticas e recursos às vezes contrapostos como; a identidade perdida; a consciência do absurdo da existência; a tensão entre dicotomias como consciência-inconsciência, sonho-realidade; as oposições sentir-pensar, pensamento-vontade, esperança-desilusão; o recurso ao anti-sentimentalismo e a inteletualização da emoção; o negativismo surgido da solidão, o cepticismo, o tédio, a angústia, o cansaço, o desespero e a frustração; a inquietação metafísica como a dor de viver; e de forma especial o auto-análise. Pessoa escreve com intenção de transmitir uma musicalidade (aliterações, rimas e ritmo), usa um verso geralmente curto (às vezes é longo como em alguns dos heterónimos) no qual predomina a quadra e a quintilha, reforça as pausas com a pontuação, usa uma adjetivação bastante expressiva que nos remete ao simbolismo constantemente, transgrede o plano do literal com ironias, paradoxismo, metáforas e recursos vários por aí fora. Se há uma palavra para expressar essa densidade ensaística e poética dele é a palavra «riqueza», sem dúvidas.
A constelação heteronímica
A heteronímia no singular ou constelação heteronímica no plural é um recurso literário que consiste na divisão da voz literária em duas ou várias personagens fictícias -os pseudoautores- que assumem a autoria plena dos textos assinados por eles mesmo tendo sido escritos pelo ortónimo -o autor real-. Esta designação técnica tomada do grego (ετερóς = diferente; + όνομα = nome) se diferencia do pseudónimo (ψευδο = pseudo + όνομα = nome) no sentido em que este último só atribui um nome fictício à obra para fugir da autoria por causas várias, como pode ser a perda de responsabilidade vinculada à apropriação penal das obras, e o outro constitui uma criação de uma personalidade irreal mas que a partir da qual é gerada a obra artística. Não se trata portanto de uma personagem plana como as que encontramos nos contos infantis, é uma pessoa irreal mas que tem o releve e todas as caraterísticas como é a história da sua vida e a personalidade de uma pessoa plenamente real. No casso de Pessoa este fenômeno se dá em múltiplas ocasiões, criando uma constelação heteronímica descomunal e indubitavelmente complexa. Os heterónimos pessoanos têm consciência da existência dos outros em alguns casos, mantêm eventuais relações por vezes de amizade e por vezes de conflito ou oposição. Por tanto estamos a tratar de uma constelação de sujeitos que está em constante movimentação, não é um grupo de entes assépticos, são sujeitos que dispõem de um certo grau de independência e, portanto, encaminham suas criações literárias «como placidamente querem». É interessantíssimo reparar nas relações que se estabelecem entre os próprios heterónimos e incluso com o ortónimo. A importância de todos os heterónimos não é igual, posso afirmar que existe uma hierarquia, se me permite a expressão, que segundo o número de textos (assiduidade do discurso) e a qualidade (nos seus diferentes graus) e o tipo dos mesmos (prosa, lírica, obras epistolares...) se configura o posicionamento que eles ocupam nessa estrutura de poder. Repare então na representação gráfica da Figura 1 (infra) acho apropriada para esquematizar a mencionada constelação heteronímica que parece representar uma constelação no sentido estrito e que tem uma elíptica na qual confluem, convergem e encontram-se o ortónimo e os heterónimos.
Figura 1 |
A parte da relevância obvia do ortónimo (Cancioneiro, Poesia Lírica & Épica, Poesias Coligidas, Mensagem, Poesias Inéditas, Poemas Para Lili, Tragédia Subjetiva», Chuva Oblíqua, Passos da Cruz, Poesias de Orpheu, Quadras ao Gosto Popular, Canções de Beber, Poesia Inglesa, Poesias Dispersas), só outros três heterónimos conseguiram em diferentes momentos ser tão importantes; Alberto Caeiro (em 104 poemas em três publicações diferentes), Ricardo Reis (em publicações na revista Athena, odes na revista Presença e outras publicações póstumas) e finalmente Álvaro de Campos (em Passagem das Horas, Apontamento, Tabacaria, Magnificat, Aniversário, Lisbon Revisited, Poema em Linha Reta, Ode Triunfal, Se te Queres). Álvaro de Campos mesmo não sendo o centro de nenhuma elipse e dependendo da elipse de Caeiro, é o ente que mais se aproxima ao Pessoa ortónimo, embora seja de forma relativa e acidental, nesse percurso de movimentos circulares que poderíamos assemelhar, se calhar, ao discurso literário de Fernando Pessoa. A carta a Adolfo Casais Monteiro explica a origem da heteronímia.
Como comentei na introdução da postagem acredito na existência de uma relação entre Fernando Pessoa e a Teoria da Morte do Autor de Roland Barthes mesmo sabendo do lapso temporal que separa a estes autores. Pessoa já começou a ser consciente da insignificância e falsidade do nome do Autor, isto está claramente latente em poemas como Autopsicografia, mesmo ele fazendo referência só ao autor poético. Pessoa sabe que o autor não é o dono dos seus escritos, que nasce, cresce e está imerso numa cultura da qual toma os elementos necessários para criar essa fraudulenta «obra genuína» de elementos misturados e desenvolvidos e talvez por isso decide dividir a voz literária em autores heterónimos, desde o seu ponto de vista, tão legítimos e reais como o ortónimo. Portanto uma vez mais se confirma a teoria dos seguidores da corrente deconstrutora* da Literatura; o Autor ou emissor (no esquema de Roman Jacokson) é na verdade a Cultura, e aliás, «O Autor é como Pai Natal, não existe mais cumpre uma função social, e essa função social é a de apropriação penal das obras [sic]». Dá para perceber disto nos diferentes heterónimos que falam diferentes línguas e tratam diferentes temas segundo a «etapa e contexto cultural» do seu criador, a influência que há em cada um deles desses aspetos é visível e ainda sabendo do caráter fictício da Literatura -que não está no mundo real senão no mundo dos mundos possíveis e, portanto, que não podem ser estabelecidas ligações entre vida e obra do autor-. Pessoa manifesta uma visão antecipada ao seu tempo e a suas circunstâncias, uma visão vanguardista, até progressista.
Álvaro de Campos
Álvaro de Campos se não é o grã alter ego de Fernando Pessoa, poderia sê-lo perfeitamente. Com isto não quero dizer que se possa vincular diretamente a este heterónimo e ao ortónimo no que tem a ver com a obra pois seria um erro fácil de acometer, porém pode-se considera-lo como o outro «eu» mais destacado de Pessoa perante os outros heterónimos todos. Álvaro de Campos comparte com Pessoa temática como a do decadentismo, o pessimismo, o futurismo, e em menor grau o sensacionalismo. Estas partilhas temáticas não se produzem ao mesmo tempo, Álvaro de Campos na sua plena complexidade de ente quase real evolui e vai passando por umas e outras, deixando obras de grande valor.
Segundo a biografia que Pessoa atribuiu a Álvaro de Campos, nessa pretensão de transformar aos heterónimos em pessoas com uma personalidade o mais real e dinâmica possível, ele teria nascido em Tavira(?) o 15(?) de outubro de 1890. Teve uma educação se calhar um pouco fraca num liceu qualquer, mas depois foi prà Escócia e lá se formou em Engenharia Mecânica e um tempo depois foi para Glasgow e lá se formou também em Engenharia Naval. Uma viagem feita pero oriente -pelo Canal do Suez- iria a abrir a mente dele e lhe descobrir novas realidades por aquelas terras, nas quais a inspiração teve como resultado obras como Opiário, dedicado ao seu amigo Mario de Sá-Carneiro. Após este grande percurso intercontinental que ele fez volta a Portugal onde lhe esperava o mestre dele, Alberto Caeiro. Álvaro de Campos surge quando Pessoa sente uma vontade imperiosa e inexplicável de escrever, de criar, nasce para se contrapor a Alberto Caeiro, motivos pelos quais não vou entrar a valorizar por serem muito fecundos e incertos. Argumenta o próprio heterónimo o que segue; «O que o mestre Caeiro me ensinou é a ter clareza; equilibro, organismo no delírio e no desvanecimento, e também me ensinou a não procurar ter filosofia nenhuma, mas com alma [sic]». Campos toma de Caeiro a inquietação por sentir, mas Campos vai desenvolver esta inquietação de uma forma revoltada até o seu extremo; tudo o que sentimos tem que passar pelos sentidos então é importante prestar-lhes a atenção e o tempo devido. O mestre Caeiro é muito objetivo, isto vai ser mudado radicalmente por Campos por sua condição empirista, o subjetivo impera e rege, Campos deixa-se levar pelos sentimentos.
As caraterísticas que Fernando Pessoa lhe confere pode-se dizer que são as de uma pessoa vanguardista, cosmopolita e progressista. Vemos tudo isto nos seus poemas. Campos tem um ponto de vista urbano, próprio de um homem de cidade, às vezes até se mostra desencantado e aborrecido pela qualidade desencantadora do quotidiano citadino. O futurismo é a sua doutrina principal e nesse sentido defende a industrialização e mecanização dos labores que realizam os homens da cidade em contraposição com as técnicas rudimentares e pouco produtivas do campo. O empirismo está muito presente na obra do heterónimo, há uma grande motivação por sentir, sentir pelos sentidos todas as coisas que na cidade podem-se sentir como a força dos mecanismos, a velocidade das coisas materiais e questões várias por aí fora. Álvaro de Campos faz uma apologia constante à modernidade com um estilo brutal, segundo algumas críticas literárias até violento e delirante, de alguma forma plasma nos textos a dureza do nível tecnológico da época que ele percebe por observação direta, e com certeza, que conhece bem por causa dos seus estudos de engenharia.
Analise literário de Álvaro de Campos
A priori é preciso periodizar a trajetória literária dele em três fases, como já comentei que acontece com a sua obra. Uma primeira claramente decadentista, romântica, influída pelo simbolismo; o «eu» poético se encontra aborrecido, queixado de um grave tédio que aplasta as expectativas vitais, é então quando a procura de novas sensações vira doutrina geral (como acontece em Opiário).
Uma segunda fase aparece e muda a temática e estilo do autor, é uma fase muito mais sensacionalista e com ânsias de futuro incerto mas que a curiosidade traz a mente e as reflexões. A mecanização da vida humana, a sensualidade dos artifícios que acordam os sentidos, há aqui muito do futurismo, parece que estamos a ler uma continuação do Manifesto futurista na Ode Triunfal e na Ode Marítima embora não sejam tudo vantagens para os homens, a vida moderna com a tecnologia moderna, nos adverte, polui-nos física e mentalmente. Em Ultimatum, publicado na polémica revista Portugal Futurista, Campos nos mostra a crueza da guerra, insulta a Europa e exclama com palavrões para o leitor não ficar indiferente. O nomeado poema faz lembrar a crítica francesa ao próprio país que se estende no tempo até a atualidade com canções como L’Hexagone de Renaud. Além do mais, suscitou representações em outras artes...
Finalmente experimenta uma fase pessimista. O «eu» poético fica nu perante o leitor, é uma etapa muito íntima e subjetiva. Trás o percurso de toda a sua existência o «eu» compreende que a solidão e a frustação de projetos não realizados por causa de fatores externos, Campos está cansado e abatido pela vida e isto é uma carga que vai administrar sozinho. Repare por exemplo em Tabacaria, o autor está tão abatido, se fez tão pequeno e atrofiado que não se considera nada, nada que valga a pena. Trata-se de uma pessoa esquecida com um feitio complexado, que vive uma vida como a de outra pessoa qualquer, numa miséria qualquer. «Falhei em tudo [sic]». Existe uma semelhança inquestionável desta obra e o Poema em linha reta do ortónimo; «Nunca conheci quem tivesse levado porrada, todos os meus conhecidos foram campeões em tudo... [sic]». Do mesmo jeito que Pessoa, Campos percebe que é diferente do resto, por diferentes motivos mas que todos têm a ver com o campo semântico dos defeitos pessoais e as circunstâncias nas quais o autor vive. Outros heterónimos não podem ser considerados alter ego de Pessoa porque não encontram essas semelhanças temáticas e estilísticas, até se expressam em diferentes línguas e sobre temas que nada têm a ver com Pessoa e a essência do ortónimo, o verdadeiro ser.
A percepção que ele tem de beleza é um tanto peculiar, talvez inefável pois o excesso de metáforas e ironias é muito latente nos seus versos. Campos não diz claramente o que é a beleza, insinua-o freqüentemente pois está implícito nos textos.
Conclusões
Concluo a presente postagem do mesmo jeito que eu comecei: me afirmando de novo na idéia de que Álvaro de Campos supõe a parte mais importante de Fernando Pessoa, sem ele não poderíamos ter essa consciência de alter ego pessoana -pois os outros heterónimos estão muito ou bastante afastados do ortónimo em todos os sentidos intencional ou não intencionalmente, tanto faz- e além disso da importância que sustenta no modernismo português e internacional. Aliás, aproveito para louvar a Harold Bloom por tê-lo incluído no seu cânone literário porque se eu tivesse que adicionar um literato português a este artifício -taxonômico e classificatório- segundo relevância e qualidade também escolheria a Fernando António Nogueira Pessoa e todo o universo diegético e a força vital que traz consigo, pois «tudo vale a pena se a alma não é pequena [sic]».
Bibliografia e documentação
- AA.VV., História da Literatura Portuguesa, Mem Martins, Alfa, 2001-2003, 7 vols.
- GAVILANES LASO, José Luis – LOURENÇO, António Apolinário (Dirs.), Historia de la Literatura Portuguesa, Madrid, Cátedra, 2000.
- MARCOS, Ángel – SERRA, Pedro, Historia de la literatura portuguesa, Salamanca, Luso-Española, 1999.
- REIS, Carlos (Dir.), História Crítica da Literatura Portuguesa, Lisboa-São Paulo, Verbo, 1998-, 9 vols. en curso de publicación.
- SARAIVA, António José, Breve historia de la literatura portuguesa, Madrid, Istmo, 1971.
- SARAIVA, António José - LOPES, Óscar, História da Literatura Portuguesa, 17 ª ed. Porto, Porto Editora, 1996.
- Portal da Literatura; o portal da literatura portuguesa. Fernando Pessoa [Em linha, disponível em: www.portaldaliteratura.com/autores.php?autor=339].
- Centro Virtual - Instituto Camões [Em linha, disponível em: www.cvc.instituto-camoes.pt]
- GUITA E JOSÉ MINDLIN, Biblioteca Brasiliana [Em linha, disponível em: www.brasiliana.usp.br].
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